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segunda-feira, 30 de abril de 2012

A construção ideológica dos padrões éticos - morais e a naturalização da obediência civil.



A  valorização das regras morais de conduta de comportamento, mormente confunde-se com os próprios valores morais que insurgem no seio da família, da igreja, do estado e da sociedade. A ética no seu desenho filosófico internaliza-se de modo subjetivo em nossas condutas diárias de modo ideológico, e como paradigmas sociais se transformam em leis de moralidade que partem de cima para baixo. Estas regras costumam ter validade somente entre os que não se inter-relacionam com as formas de poder existentes nas relações sociais capitalistas.
Os padrões éticos morais estão intimamente ligados com o poder econômico e político que interpelam uma relação hierárquica e desigual em todas as relações sociais, por tanto não poderia ser de outra maneira, que não a forma imperativa que se formam valores morais burgueses os quais devem ser assimilados e praticados com uma obediência bestial pela sociedade civil.
A subordinação às regras de comportamento encontra-se firmemente reproduzida historicamente entre os grupos sociais passando de geração em geração e ganhando novos conceitos de acordo com as mudanças que ocorrem dentro da sociedade, porém, o cerne da questão continua sendo o favorecimento que os valores éticos oferecem as classes mais abastadas. Os donos do capital financeiro subordinam-se de modo equivalente a classe expropriada com relação ao cumprimento das regras de comportamento vigentes dentro da organização social? Tratamos deste modo da mercadorização da ética, que agora enquanto objeto de consumo, tem como base fundamental a acumulação de capital, mais precisamente, o montante de dinheiro acumulado com as transações econômicas possíveis dentro do mercado de livre comércio. O único lugar onde ética tem tratamento de modo diferente fica entre os donos do capital, e a cada classe, cabe seguir a ética que lhe foi imposta. Assim como a cultura de uma época é a cultura dominante, a ética de uma época é a ética dominante. Obedecemos às condutas de comportamento da classe que domina. A chamada classe burguesa, classe esta a qual foi incumbida à tarefa de criar e impor as regras que todos deveriam seguir. Porém esperar que a própria classe burguesa seja fiel as próprias regras de comportamento, é esperar que a raposa cuidasse muito bem do galinheiro e deixasse as galinhas intactas.
O poder econômico é o único capaz de transgredir qualquer parâmetro de conduta ética, e ainda sim criar a sensação de justiça feita dentro da sociedade. Ética e moral são expostos pelos estudiosos como elementos distintos, enquanto o primeiro trata do humano, da universalidade, do permanente, o segundo trata do cultural e temporal. Eis que uma confusão generalizada assombra a ética, quando a moral, é justamente o elemento que define os padrões éticos, o que seria a sobreposição de uma cultura sobre a outra. Isso acontece quando, por exemplo, países entram em guerra e por consequência há uma dominação de um sobre o outro, isso se dá também nas relações estabelecidas com os índios no Brasil. Porém tudo isso acontece sob uma cortina fina de hipocrisia. Esta cortina de cinismo tende a ignorar veementemente a existência da imposição dos valores hegemônicos para toda a classe dominada, e alega tratar como iguais no regimento moral.
Todos os valores morais, éticos, são os valores que se baseiam no homem virtuoso, aquele que pratica o bem. Isso tem intima relação com uma visão maniqueísta de mundo, onde se dividem os seres e as ações em divinas e profanas. O homem bom teria como principais características, os valores estabelecidos na religião, e se constroem nos valores da igreja. O homem bom é o homem que não revida, é o homem que aceita as condições impostas por Deus, é o homem que não mata e que respeita a propriedade privada.
Existem duas éticas, a ética ideal e a ética concreta. A ética ideal é justamente aquela que foi pensada pelos teóricos enquanto regras de conduta que viriam beneficiar toda a humanidade, no entanto a ética concreta consiste justamente na realidade a qual se empregam os valores éticos de uma época, deste modo a ética vem a servir os interesses de uma classe, isso por que a época diz respeito a uma sociedade classista, que tem como bases organizacionais o sistema econômico capitalista. Neste sistema todos os elementos partem de um pressuposto ideológico burguês, que tem como premissa criar a sensação de liberdade e igualdade entre os povos, mas que concentra o verdadeiro poder de decisão nas mãos de poucos.
Perguntamos-nos cotidianamente, como estes poucos donos do capital, são hoje os donos do capital, e voltamos a uma discussão ética sob a ótica da ética concreta. Só quem é dono e tem o poder, é que pode dizer o que é certo ou errado, ou o que é bom ou mal, criando no seu povo dominado os paradigmas de uma época através da força. Hoje a ética é aquilo que aprendemos na escola, tem a ver com educação, com bons modos, com princípios que já estão incutidos, assimilado de uma maneira, que se torna praticamente impossível conceber quaisquer atitudes que a nosso ver seja totalmente amoral, como o canibalismo por exemplo. Mas antes que estes padrões éticos tornassem intrínsecos na sociedade, eles precisaram ser impostos de maneira violenta, e são impostos assim até hoje. Por exemplo, é ético uma grande potencia como os Estados Unidos usar de seu arsenal bélico com justificativas de encontrar um criminoso, inimigo da sociedade, para encontrar minérios raros, em outro país? Pode-se refletir o quanto quiser sobre esta questão, por que não há parâmetro ético suficientemente capaz de dizer o que é bom ou mal para quem possui o poder. Quem tem o arsenal bélico maior é quem vai decidir o que é ético ou não.
Por isso, conclamo que sejamos antiéticos, sem virtude, e pouco civilizados, que deixemos de lado essa diplomacia enraizada, que nos impede de entender que não precisamos dar a outra face para bater, nós podemos revidar, e que isso pode parecer amoral, mas moral é cultural, é constructo social, e nós nunca fomos consultados para saber o que realmente é bom ou mal para nós mesmos, nós simplesmente imaginamos isso. Nós não somos livres, apenas idealizamos a liberdade. Ser ético não significa obedecer as regras de conduta sociais impostas por uma classe dominante, como uma criança que obedece a mãe com medo de quebrar o vaso chinês na mesa de centro da sala. 

domingo, 15 de abril de 2012

A democracia irônica de Willy Wonka e a guerra fria virtual



Opinar, julgar, condenar, são características que sempre estiveram entre as diversões preferidas da humanidade. Quem no fim das contas não adora que os outros saibam o que pensam? A redoma de vidro flácido que se criou no mundo virtual tornou qualquer paquiderme um formador de opinião. Emitir opinião nunca foi algo tão simples e natural. Emitir opinião nunca foi tão democrático e irritante como nos últimos tempos. Estamos à mercê de um bombardeio de barbaridades que refletem todos os preconceitos velados, todos os desejos crueis mais íntimos que agora ganham uma carinha irônica do Willy Wonka, com certo ar de “Eu te mato com um sorriso no rosto”.
Tudo fica bem mais divertido e suave quando nossa opinião tacanha ganha subterfúgios em uma imagem animada e colorida. Até por que, só compartilhamos de uma opinião da qual outras pessoas compartilharam antes. É perceptível o ato covarde que precede este esboço de opinião que se espalha pela rede. Poucos são capazes de sustentar tais opiniões que disseminam de modo amistoso e simpático, com argumentos que no mínimo transcendam este monólogo do qual algumas pessoas transformam a vida. Quem esta disposto a ouvir a opinião contrária, ou até mesmo que reformule a primeira opinião formada de modo fechado e equivocado?
Até que ponto a individualidade do outro, influência e modifica a minha vida e a minha individualidade? É verdadeira a máxima de que se cada um fizer a sua parte todos os problemas do mundo estarão automaticamente resolvidos? Mas quem e como se delimita qual é a parte de cada um? Quem define as funções?
Há quem diga que as funções são dadas pelo Estado, outros que Deus e o destino, porém as funções estão adequadas ao modo de reprodução social em que estamos inseridos, dada numa sociedade classista, as funções diferem-se de acordo com a classe econômica da qual se faz parte. Ou seja, cumprir sua função nada mais é que ser ordeiro e submisso às imposições de uma classe dominante. Cumprir a sua função é reproduzir valores morais éticos religiosos que te tornem suficientemente virtuoso para ser acolhido na sociedade com um homem de bem, e no céu como uma boa ovelha, adestrada, domada.
Willy Wonka vem para ambas às possibilidades, disseminar os valores morais incutidos, chafurnados no ideário de uma grande massa cristianizada, que se sente ofendida ao ter seus valores questionados e refutados veementemente por outras pessoas, que também por meio de uma série de opiniões o fazem. No entanto o que difere as opiniões são justamente as fontes em que se bebe para adubar tais conceitos de moralidade. No entanto se nada pode ser tomado como verdade absoluta, por que insistir numa discussão que se baseia em dois pontos de vistas opostos? Creio que o simples fato de tomar uma posição te torna capaz de refletir sobre o tema, e sobre a possibilidade de se auto transformar. Mudar de opinião, ao contrário do que a maioria pensa não  é uma coisa ruim, pelo contrário, desde que seja uma mudança que parta da transformação por meio de conhecimentos adquiridos historicamente pelo homem a respeito dos fenômenos sociais e naturais, capazes de explicar sem obscurantismo e misticismo a realidade concreta. Se eu não tivesse mudado de opinião, se as pessoas não forem capazes de mudar de opinião o debate seria algo desnecessário.  Por isso nomeio guerra fria, o debate de opiniões que se reproduz nas redes sociais, pois não partem de um debate aberto, partem de uma opinião fechada, concluída, e privada, no qual poucos vão ter a ousadia de interagir com questionamentos ou outros pontos de vistas. Os que se identificam com o ponto de vista compartilham quase que cegamente. Se um dos contatos do seu Facebook compartilhou uma opinião de aversão a Deus, logo um cristão, posta sua opinião genérica em defesa de sua religião, numa resposta a altura, cheia de engodo, e o contrário, é uma verdade. Toda opinião acaba sendo uma contra opinião a uma primeira opinião formada, e não há quaisquer transformações. A linha do tempo do Facebook virou um campo de batalha de opiniões, das mais rasas as mais ousadas e profundas opiniões, mas não são opiniões que dialogam entre si, elas se repelem como água e óleo.
Alguns opinam intensamente com a neutralidade e sobriedade de quem não se envolve em polêmicas de Facebook, que não poderiam ter o mesmo vigor de qualquer outro debate, mas que possuem uma carga fenomenal do que se constitui as pessoas, e é digno de reflexão constante.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Vivendo a vida do "Pelo menos"



Este poderia ser só mais um ensaio sobre o conformismo e a aceitação das condições impostas pelo modelo societal vigente, ou poderia ser o enredo intrigante sobre um ser humano de vida vegetativa, imerso em um cotidiano sem sentido, tomado por uma eterna sensação de vazio. Poderia também tratar dos anseios e desconfortos reais, de pessoas reais, bem como personificações de tabelas e gráficos, que mensuram a miserabilidade humana, e como se constroem o que muitos chamam de ópio do povo.
“Melhor pingar do que faltar” justifica os salários miseráveis de diversas áreas profissionais, afinal, poderia ser pior, imaginou-se desempregado? Melhor que desempregado, é ser explorado dia após dia, melhor que ficar em casa sendo chamado de vagabundo, ou vadio, é ser explorado dignamente por uma vida inteira, tornando-se um ser desconexo, aleatório, que vaga como uma alma no purgatório sem saber ao certo o seu destino. Teme pelo inferno pós-morte, e vive o inferno na terra, como quem busca o paraíso prometido. Ganha pouco, mas “pelo menos” tem um trabalho, são injustiçados todos os dias na terra, mas “pelo menos” garantem seu lugar no reino dos céus.
Constatei muitas inquietações a respeito do não fazer nada, dizeres aterrorizantes como “Odeio ficar em casa sem fazer nada” ou “Não sei ficar em casa nas férias, não sei o que fazer”,  demonstram a falta de intimidade que temos com o ócio, e não poderia ser diferente, o ócio foi demonizado pelos proprietários do tempo, nos sentimos mal, infringindo uma lei quase que intrínseca, inculcada, internalizada, e digo mais, normatizada. Muito mais que heteronormativa, a sociedade valoriza o tempo que é produtivo, sendo assim de que serve o tempo que nada se produz na sociedade do consumo, do mercado e da coisificação do homem? Não tenho tempo de ver meus filhos, mas “pelo menos” deixo-os em tempo integral na escola, e “pelo menos” tenho um salário para dar de comer a eles. Veja, o “pelo menos” não conhece classe social, no entanto, tento me ater, ao “pelo menos” do qual eu realmente gostaria de falar. E este, justamente trata da desigualdade e da luta de classes. Tem a ver com, “Não tenho um carro de 800 mil reais, mas ‘pelo menos’ tenho uma moto velha que não me deixa na mão”.
Vivemos, nós mortais com uma indignação crônica, perto desse otimismo exagerado que leva a um conformismo estapafúrdio, não sou contra ser positivo, muito menos contra valorizar as boas coisas da vida, no entanto eu sou radical, extremista e irredutível, quando as frases e as situações ganham uma compensação que se correlaciona com uma infelicidade. É como, por exemplo, dizer a alguém que esta com câncer algo como, “pelo menos esta vivo”. Perceba que estar vivo para uma pessoa que esta com câncer, não pode ser uma compensação, por que desta forma se tivesse morrido eu poderia mudar a frase para “morreu, mas pelo menos nunca teve câncer”, é como trocar seis por meia dúzia, não muda absolutamente nada. Não tem nada a ver com pensar positivamente.
O fato, é que esse “pelo menos” torna-se uma constante na vida das pessoas, uma vida repleta de compensações baratas, das quais se vê obrigado a aceitar. E não reclame nunca, por que tudo pode piorar com certeza. A vida é precarizada de cabo a rabo, desde a educação com o “estudou a vida toda em escola pública, mas “pelo menos” é esforçado e passou no vestibular”, até o “roubaram a tua moto, mas ‘pelo menos’ te deixaram vivo”.  Quer dizer, agradeça por estar vivo, agradeça por existir, por que realmente, no mundo em que vivemos, pessoas como nós, pobres explorados até a exaustão não merecemos estar vivos, não merecemos conviver com toda essa gente que não precisa compensar absolutamente nada, essa gente que misteriosamente tornou-se dona de todas as coisas, de todas as terras, de todas as máquinas, de toda criação humana, da história e do próprio homem. “Pelo menos” inventaram o governo e o assistencialismo como mola amortecedora das articulações sociais, “pelo menos” a classe dos miseráveis, esta desaparecendo, eles subiram para a classe dos moradores de rua, um grande progresso. “Pelo menos” criaram praças e clubes esportivos para divertir, “pelo menos” no centro da cidade o prefeito faz bem feitorias, “pelo menos” nós sabemos escrever o nosso próprio nome, “pelo menos” temos o direito de eleger nossos representantes, “pelo menos” eu não votei nesse ladrão, “pelo menos” minha consciência esta tranquila, “pelo menos” eu sou feliz trabalhando, chegando a casa com o sol já posto, assistindo televisão e tendo uma noite de sono para repetir tudo isso no próximo dia, “pelo menos” tenho Deus no coração. A policia mata um inocente, “pelo menos” cria provas e torna o inocente criminoso, batem antes de perguntar, “pelo menos” pedem desculpas.
O “pelo menos” reflete a coação do homem frente ao poder invisível e visível que os homens de negócio imprimem em nossas vidas. Somos coagidos a aceitar as condições mínimas, para não viver sem condição alguma, é um tal de “afasta de mim este cale-se” que não termina nunca. 

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