Bomba de Verdade
Anabolizantes atraem jovens em busca do corpo perfeito; muitos usuários desconhecem perigos
Rodrigo Braga/Folha Imagem
TARSO ARAUJO
DA REPORTAGEM LOCAL
"Não tenho medo de perder o braço, mas de ficar "frango'", diz Jonas*, 22, que usa "bomba" desde os 14 anos.
E "frango", se você não sabe, quer dizer fraco.
A frase do jovem expressa bem o sentimento de quem recorre a essas substâncias em busca de um corpo forte em tempo recorde: ficar em forma é mais importante do que a própria saúde.
Há meses sem malhar, ele nem toma mais os anabolizantes esteroides, hormônios sintéticos que ajudam os músculos a crescer mais rápido.
Injeta nos bíceps um remédio veterinário comprado sem receita em pet shops e apenas aumenta o volume do braço.
"Se aplicar errado, o braço necrosa e tem que amputar", diz, antes de dar uma risada.
William*, 18, é mais cauteloso. Ele está esperando parar de crescer para começar a tomar, já que os anabolizantes podem atrapalhar o crescimento.
"Quero tomar para melhorar meu corpo. É uma questão de autoestima", diz ele. Apesar de afirmar estar satisfeito com seu físico, diz que "querer melhorar nunca vai ser ruim".
Para ele, a vontade de tomar é combinação de pressa por resultado e curiosidade -coisas de gente da sua idade.
"Tenho muitos amigos que tomam. Muitos mesmo. Todos entre 18 e 20 anos."
Jéssica*, 24, começou a malhar porque não gostava das pernas finas -"tinha vergonha de usar short"- e acabou gostando: virou campeã brasileira e sul-americana de levantamento de peso.
Ela diz que resistiu à "tentação", mas que não foi fácil.
"Era louca para tomar "bomba". É a coisa mais normal no meio [do esporte]. Mas eu tive um ótimo treinador, que me falava sobre os efeitos. Vi amigas se transformarem com o tempo, com voz grossa, criando barba, espinhas..."
Pressa e trauma
Para alguns, como Bruno*, 22, a experiência foi traumática. Aos 18, ele queria ficar forte. "Era epidemia aqui onde eu morava. Todo mundo malhava. E eu tinha pressa, né?", conta.
Comprou duas ampolas de anabolizante injetável e aplicou-as em si próprio, uma por semana. "Não deu resultado."
Depois comprou outro, em comprimidos. "Tomei um por dia, por duas semanas." Aí o resultado apareceu. "Fiquei sete dias internado. Um em coma."
O diagnóstico foi uma crise hepática aguda, causada pelo excesso de hormônios no sangue. "Nunca mais eu tomo", diz.
Por causa de casos como esse, o deputado federal Capitão Assumção (PSB-ES) criou um projeto de lei no Congresso Nacional para tratar vendedores clandestinos de anabolizantes (veja ao lado) da mesma maneira que traficantes de drogas.
Mesmo que isso aconteça, a decisão entre saúde e beleza sempre vai ser de quem toma.
"Em pessoas mais jovens, os efeitos colaterais podem ser piores", diz o especialista em fisiologia do exercício Paulo Zogaib, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Esta foi uma reportagem retirada do site Folha da Uol. O uso de anabolizantes não é novidade para ninguém, porém a reportagem não perde seu teor assustador, ao se ouvir um jovem arriscar a beleza de que tanto prima, pela própria beleza. Perder um braço, para ser forte? Mas que escolha mais absurda! É essa contradição nas falas dos jovens que nos remete a outras contradições, como por exemplo, a essência do tempo livre ao qual o jovem se submete, preso aos conceitos e padrões de beleza que compõe o universo do tempo de não trabalho, e do uso deste em função do capital. Ainda me lembro dos bons tempos em que tais objetivações não me afetavam, nem afetavam meu tempo livre, pelo menos não com tanta violência, e com essa capacidade destruidora, com qual vem fazendo vitimas nos últimos tempos. Essa moda dos jovens de achar-se super homens, pode sempre ter existido, mas a perca de noção de realidade, e das verdadeiras conseqüências de seus atos parecem não assustar mais tanto assim, e é dessa forma que todo ato de liberdade acaba preso ao falso entendimento de ser livre, que consiste em se imaginar livre de acordo com o que nos é posto como liberdade. Ser livre para consumir? Para ir ao shopping, seguir a moda, ver TV? Ser livre até onde o dinheiro permite? De que tipo de liberdade estamos falando afinal? Ser livre é não precisar trabalhar? Dai que se concretizam os equívocos sobre o uso do tempo livre, o tornando inconseqüente e perigoso. Se no tempo de trabalho estou sempre a postos a satisfazer a vontade de um ser superior a mim, se não são as minhas necessidades que estão sendo supridas, se o produto final me é alheio, é algo do qual não entendo como meu, ou parte de mim, ou se ainda o processo não é compreendido enquanto o todo, me encontro então alienado a tudo o que no fim envolve este meio, e justamente meu tempo de não trabalho se vincula a este tempo de trabalho, reproduzindo-o, daí a persistência em satisfazer os desejos alheios.
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